Pioneirismo e Sustentabilidade na Amazônia

Os textos desta coletânea documentam aspectos do processo de formação em administração de empresas numa grande universidade brasileira. Alunos desta área, matriculados na pós-graduação da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, elaboraram os trabalhos aqui reunidos, após leitura de bibliografia pertinente e aplicação de questionário exaustivamente pré-discutido até sua plena assimilação. O tema escolhido foi o engajamento de empresas da região amazônica em propostas de sustentabilidade ambiental, com ênfase na mitigação de gases de efeito estufa. Procedeu-se, antes da escolha das empresas e consequente levantamento de dados, amplo debate em classe da questão a ser investigada.

Encontram-se, no resultado obtido, um volume de informações e acurados juízos em torno da matéria. Como é frequente em textos coletivos, alguns conteúdos apresentam maior densidade que outros. Cabe ao leitor identificá-los, uma vez que todos, indistintamente alcançaram o patamar requerido para aceitação acadêmica. São escritos que trarão aos visitantes deste espaço digital um quadro fiel e objetivo das ações empresariais de sustentabilidade na mais complexa região do País.

Grandes corporações brasileiras estão demonstrando que a prática sustentável, além de legítima, é uma boa opção estratégica. A Companhia Vale do Rio Doce, segunda maior mineradora do mundo, aplica uma engenharia de exploração menos danosa ao ambiente. Respeitáveis organizações não governamentais, como a Amigos da Terra, reconhecem publicamente que a Vale costuma ter um cuidado maior no modo como explora minério, se comparada a outras empresas do setor.

Mesmo assim, desenvolvendo uma atividade notoriamente causadora de impactos ambientais e sociais, a empresa em análise tem enfrentado veementes censuras, originárias de grupos religiosos e políticos. O trabalho aqui apresentado pelos alunos Luis Felipe Bismarchi e Marina Carrilho Soares registra manifestações contra supostos descumprimentos da legislação trabalhista e contaminação da água, poluição do ar ou subsidência do terreno. Outros impactos negativos da mineração, igualmente apontados por seus críticos (especificamente no caso da Vale) vinculam-se ao surgimento de siderúrgicas no entorno das explorações. Tais indústrias usariam carvão vegetal para a produção de ferro gusa – o que ocasionaria, anualmente, um desmate de 300 mil hectares de floresta primária.

Comentam os alunos que a empresa reage a essas acusações com iniciativas sustentáveis, a seguir mencionadas, que foram extraídas de informações bem documentadas e disponíveis na web. Os autores do estudo não tiveram um diálogo maior com a direção corporativa, em função de sua política de confidencialidade excessivamente rígida. Valeram-se por isso, talvez em demasia, de informações já divulgadas na mídia ou no site da companhia, além de entrevista de um funcionário que, mesmo depondo a favor da empresa, exigiu anonimato. Agiria bem a Vale se flexibilizasse esta política de informações, facilitando o trabalho de jovens pesquisadores em fase de formação acadêmica.

A Companhia Vale do Rio Doce, desde 2005, empenha-se na identificação de oportunidades para mitigação de gases de efeito estufa. Foi implementado, por exemplo, no estado do Pará, o projeto de redução de PFC (perfluorcarbono) na Albras, sua empresa produtora de alumínio, ali sediada; algumas de suas usinas de pelotização de minério de ferro já substituem óleo combustível por gás natural; parte de suas locomotivas, em diversas ferrovias, trocaram o diesel pelo biodiesel; e a empresa tem participado das últimas edições do Carbon Disclosure Project (CDP).

Encontraremos no estudo aqui referido uma descrição de ações sustentáveis em 15 empreendimentos da Vale. Entre outros, a edição de um Guia para fechamento sustentável das minas abertas; o reaproveitamento da água e gestão hídrica; e o programa Vale Florestar, iniciado em 2007, para recuperação das matas nativas e plantio de florestas industriais. Ambos os programas abrangem cerca de 3 mil quilômetros de áreas florestais. Prevê-se, um investimento de US$ 300 milhões até 2015.

Outra corporação de grande porte no setor de mineração, a Alcoa, anunciou recentemente a sua estratégia para a exploração da mina Juruti, no estado do Pará. Tal estratégia fixou-se desde o começo em bases sustentáveis e fortes vínculos com a comunidade local. O projeto foi analisado pelo pós-graduando Nelson Poli Teixeira Filho, que contextualizou as ações ecoeficientes e entrevistou, para descrição específica, um executivo da área ambiental da Alcoa.

O projeto Juruti produzirá 6 milhões de toneladas de bauxita por ano em sua primeira fase, podendo alcançar o montante de 10 milhões. Cerca de 1.500 empregos diretos serão gerados na fase de operação e espera-se um contingente de 4.300, entre diretos e indiretos, na etapa de instalação. Nos três primeiros anos absorverá um investimento calculado em R$ 1 bilhão.

Consciente dos impactos socioambientais que uma iniciativa deste porte causará, a Alcoa tornou-se parceira da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e do FUNBIO (Fundo Brasileiro para Biodiversidade), a fim de identificar anseios comunitários e obter uma “licença social” em suas operações. O estudo identifica no empreendimento o avesso do padrão “boom-colapso”, tão frequente na exploração madeireira, que consiste em crescimento econômico da área da etapa de exploração e, cessada esta, enorme declínio da circulação de capital na comunidade.

Ergueu-se nas proximidades da mina um espaço de convivência para discussão das atividades locais da empresa e seu embasamento sustentável. Paralelamente a estes debates, passou-se à elaboração, também participativa, de um painel de indicadores, visando o monitoramento de todos os impactos, criação de um fundo para captação de recursos destinados às ações recomendadas por um Conselho plural e desenvolvimento da agenda de desenvolvimento local para o futuro.

Vê-se, portanto, que o projeto Juruti seguirá no contrafluxo do mecanicismo empresarial que privilegia os planos de negócios e lucros dos acionistas, ignorando as demandas sociais no entorno das atividades produtivas. Estas demandas, como se sabe, são em geral remetidas ao encargo exclusivo do poder público. Desprezou-se, também, na conceituação do plano o caráter assistencialista. A comunidade foi percebida como “sujeito de direito, com capacidade de trabalho e fortalecimento”.

O estudo reproduz e qualifica cinco diretrizes da política ambiental da Alcoa na região: conservação do solo e da biodiversidade; geração de empregos decentes e capacitação da mão de obra; energias renováveis inseridas na matriz energética; competitividade dos produtos pela via da inovação e da eficiência; e consolidação de uma cultura de gestão, mediante um trabalho interno de divulgação do projeto. Prevalecem na área de sustentabilidade da empresa engenheiros ambientais com especialização em Qualidade, Segurança e Saúde.

Além da parceria com a FGV e o FUNBIO, a Alcoa mantém convênios com a Universidade Federal do Pará, Centro Universitário do Pará e Universidade Aberta do Brasil, além de frequente interação com o Museu Emílio Goeldi e com o Instituto Evandro Chagas.

O estudo sobre a Agropalma, desenvolvido por Annelise Vendramini da Silva Caridade e Fernando Mori de Castro, merece atenção especial como atividade acadêmica. Descritivo e analítico em proporções equivalentes, adota uma linguagem que pode ser compreendida por leitores de todas as formações.

Os autores elegeram como premissa metodológica a identificação da convergência dos procedimentos ambientais da empresa com as recomendações da literatura técnica examinada, concluindo pela rigorosa sintonia, no caso, entre a práxis e os referenciais teóricos. A experiência da Agropalma distingue-se por seu nítido viés estratégico. Antecipou-se, em pelo menos quinze anos, às preocupações com a sustentabilidade, hoje dominantes no meio corporativo.

O grupo Agropalma, totalmente nacional, dispõe do mais extenso e moderno complexo industrial voltado para o processamento do óleo de palma. Está presente em todo o ciclo produtivo, desde o cultivo até o refino do óleo, gordura vegetal e margarina. Possui 4.500 funcionários e registra um faturamento anual de aproximadamente R$ 650 milhões. Numa área de 107 mi hectares, usa 39 mil para cultivo e extração, destinando cerca de 64 mil a reservas florestais monitoradas. Já investiu na Amazônia, desde sua fundação US$ 250 milhões.

A partir de 1994, apostando na agricultura orgânica e deixando de utilizar insumos químicos, a Agropalma deu uma guinada em sua cultura de gestão e passou a investir em processos inovadores, reforçando a competitividade e conquistando, além de resultados comerciais, vários certificados de desempenho sustentável. Registre-se que a tonelada de óleo certificado supera de 35 a 40% o preço do óleo comum.

A Agropalma é a empresa mais certificada do setor e entre os fatores para sua performance inclui-se a existência de um corpo gerencial inovador, com idade entre 29 e 42 anos. Outro diferencial positivo é que o seu plantio é feito em área já degradada pelo desmatamento, queimadas e pastagens. Mais outro, ainda, é que a energia consumida em suas atividades vem do reaproveitamento das próprias fibras vegetais.

O estudo lista 15 ações de gestão ambiental mantidas pela empresa. Entre estas, o monitoramento periódico e tratamento de efluentes líquidos gerados em todas as atividades das indústrias de extração de óleo bruto e da refinaria; monitoramento periódico da quantidade e qualidade das águas superficiais (rios e igarapés) e subterrâneas (poços de água para consumo humano, industrial e lençóis freáticos) de abrangência do Grupo Agropalma; construção de aterro controlado para resíduos não perigosos e domiciliares do Grupo Agropalma e das vilas de entorno; reciclagem de mais de 60% dos resíduos sólidos gerados em todas as atividades; reaproveitamento de fibras vegetais e cascas de nozes na geração de energia, contribuindo na redução de consumo de combustível fóssil; reflorestamento de mais de 12,5 mil hectares de áreas degradadas; preservação de todas as matas ciliares que protegem os cursos d’água; e planos de emergências ambientais estendidos a todas as áreas, incluindo treinamentos e simulados periódicos.

Operando no âmbito do chamado Arco do Desmatamento, a nordeste do Pará, próximo do Maranhão (onde somente 23% da floresta estão preservados), a empresa faz um contraponto à cultura predatória ali dominante. De fato, o inventário de suas iniciativas sinaliza uma contribuição relevante à redução de gases de efeito estufa, embora a empresa não tenha adotado o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), em face da instabilidade nas regras e incertezas quanto ao futuro deste mercado.

Veremos no trabalho apresentado por Anita M. de Moura, Eva Daviaud e Maria Augusta Miglino um estudo de caso sobre o Grupo Orsa. Alertando o leitor para o fato de que não houve levantamento in loco dos procedimentos daquele importante conglomerado e usando informações quantificadas e fornecidas por seus executivos entrevistados, as jovens pesquisadoras emitem um juízo positivo quanto às políticas ambientais referidas. As empresas Orsa, conclui o trabalho, incorporam as regras da sustentabilidade ao seu modelo produtivo na Amazônia.

Paralelamente às informações colhidas, as autoras do texto abordam a questão ambiental em seus fundamentos conceituais. Agregam ao princípio do triple bottom line, enunciado por John Elkington, as dimensões por ele mesmo definidas para harmonizar prosperidade econômica, qualidade do ambiente e justiça social: mercado, valores, transparência, ciclo de vida tecnológico, parcerias, perspectivas e tempo de governança corporativa. Justificando o método de estudo de caso, recuperam com grande pertinência observações de Franz Bruseke sobre eventuais contrastes entre teoria e empiria, que expressam “o movimento de procura de explicação que as teorias não nos fornecem”. Sublinham que, sobretudo no caso de empresas que lidam com recursos naturais (situação do Grupo Orsa), é fundamental a incorporação do princípio da sustentabilidade às suas estratégias e cultura de gestão.

O Grupo Orsa é mais uma organização atuante na Amazônia com capital inteiramente brasileiro. Congrega três empresas e uma Fundação. Os seus produtos são os únicos no mundo que têm 100% de certificação pelo FSC, um selo que garante o rastreamento de toda a cadeia produtiva da madeira extraída. Em 2007 apresentou resultado bruto de R$ 1.245 bilhões. Adquiriu o antigo projeto Jari, hoje totalmente reformulado e desenvolvendo, como importante atividade, o Manejo Florestal Sustentável Certificado. O Jari da Orsa é uma localidade com passivo ambiental zero.

O Grupo voltou-se, na empresa Ouro Verde, para o trabalho com produtos florestais não madeireiros. Prevê-se inicialmente o processamento de derivados de castanha. Poderá, em 2010, atuar nas cadeias produtivas do açaí e do cacau, o que resultará no aumento de renda para as comunidades que vivem na floresta e proximidades. É um caso em que prevalece a gestão ambiental sobre a lógica de mercado, pois é sabido que produtos florestais, dependentes de sazonalidade, têm um retorno comercial limitado.

Os diretores entrevistados para este estudo de caso reiteraram as críticas ao Estado brasileiro que vêm marcando, na mídia, alguns pronunciamentos da empresa. Acentuaram que a iniciativa privada na Amazônia supre a ausência de políticas públicas no que concerne à educação e à saúde. Destaque-se, também, a afirmação de que o mercado interno de móveis não recompensa o esforço de empresas que buscam a certificação: “Na maior parte das vezes o consumidor escolhe madeira barata. Principalmente em tempos de crise como este. Quem vai realmente preferir pagar mais caro por madeira certificada?”

Por último, ficamos a par das ações da empresa Beraca, em trabalho realizado pelas alunas pós-graduandas Juliana Aziz Miriani Russar e Maiana Brito de Matos. Elas apresentam inicialmente um panorama geral dos fatores que situam o Brasil como um dos maiores emissores mundiais de GEE e, conforme o próprio inventário oficial, tendo as queimadas e desmatamentos como responsáveis por 75% dos lançamentos na atmosfera, enquanto apenas 25% cabem à indústria e aos transportes. Em seguida, com base no material recolhido em publicações diversas e entrevista da direção da Beraca, estuda-se a política ambiental da empresa, como empreendimento associado ao Programa de Incubação Tecnológica da Universidade Federal do Pará.

A Beraca, empresa familiar com 53 anos de história, produz ingredientes naturais extraídos da floresta e destinados ao mercado de cosméticos, medicamentos e fragrâncias. Opera de acordo com os padrões internacionais de certificação e seus fornecedores são comunidades extrativistas locais. Exporta seus produtos para mais de 40 países e tem unidades instaladas em Ananindeua (PA), São Paulo (SP), Santa Bárbara do Oeste (SP), Anápolis (GO) e Itapessuma (PE).

Em 2001, a companhia estudada implantou nova proposta de gestão sustentável e modelos produtivos ditados pelo princípio da inovação. Foi naquele ano que comprou parte da Brasmazon, empresa ligada à incubadora da UFPA, e deixou de ser apenas fornecedora de outras indústrias. Passou a desenvolver sua própria linha de ingredientes. Adquirindo matéria-prima colhida por cerca de duas mil famílias, beneficia derivados de açaí, andiroba, urucum, castanha do Pará, buriti, copaíba, cupuaçu e outros que são usados em perfumaria e cosméticos.

A Beraca é, certamente, a maior experiência de aproveitamento industrial da biodiversidade amazônica, em bases comprovadamente sustentáveis. Contribui para a sensibilização ambiental das populações locais de baixa renda, que são mobilizadas para a colheita não madeireira, com remuneração melhor do que a obtida no corte ilegal de árvores.

Na entrevista por escrito concedida pela empresa às jovens pesquisadoras da FEA/USP é contado que, em 1998, o presidente da corporação visitou a região amazônica em busca de parcerias para implementação de seu projeto sustentável. A oportunidade surgiu com a desvalorização do real para o dólar e uma consequente chance de exportar produtos da Amazônia para o mercado externo de cosméticos. Isso demonstra como empresas competitivas, adotando tecnologias inovadoras, podem aproveitar as mudanças cíclicas da economia e obter lucros. É declarado, ainda, com um pleno conhecimento de causa, que o mercado de produtos naturais e orgânicos “é o que mais cresce no mundo”. Endossa-se, desta forma, constatações publicadas por vários estudiosos da economia amazônica.

A relação do sistema produtivo brasileiro com o meio ambiente é muito peculiar e extremamente diversa da que se constata em países desenvolvidos. O primeiro traço distintivo é que, em nosso país, os transportes e economia lícita respondem, juntos, por apenas um quarto das emissões de GEE, enquanto as queimadas e os desmatamentos, principalmente na Amazônia, lançam três quartos na atmosfera. Tal não se dá porque a nossa produção tenha um comportamento ambiental exemplar, mas pelo fato de possuirmos florestas cuja magnitude, paradoxalmente, estimula maior intensidade nas ações ilegais e predatórias. Feita esta ressalva, pode-se afirmar que no Brasil ocorrem avanços tecnológicos e de procedimentos que colocam grande parte do setor empresarial em sintonia com as melhores práticas de sustentabilidade.

Os cases aqui expostos e outros já apurados ou em andamento na linha de pesquisa Para Mudar o Futuro, praticada no âmbito da USP, evidenciam que, nesta primeira década do século XXI, as empresas atuantes no Brasil deram passos de grande alcance na direção de modelos cada vez mais limpos de produção. Outros exemplos, no plano corporativo, demonstram procedimentos novos e promissores. Podemos lembrar alguns pactos já celebrados, que seriam impensáveis no século passado, quando ambientalistas e empresários defrontavam-se em conflitos perigosos e politicamente insanáveis.

A Vale, a Amazônia e a mudança do clima

Resumo

A questão do aquecimento global e de todos os impactos que ele gera extrapolou os muros da Academia e permeou toda a sociedade em todos os níveis de discussão, incluindo os grandes conglomerados corporativos e a alta cúpula dos governos ao redor do planeta a fim de se encontrarem alternativas conjuntas para minimizar os impactos das mudanças climáticas.

Este trabalho aborda a atuação da segunda maior mineradora do mundo, a Vale, na região amazônica, um dos mais ricos biomas globais, fundamental para a manutenção do clima, dos regimes das chuvas e do equilíbrio ecológico planetário e, ao mesmo tempo, uma das maiores vítimas da pressão pelo desmatamento devido a sua enorme área e às riquezas naturais de grande valor comercial presente tanto sobre quanto sob o solo da região.

Este desmatamento foi, desde o começo, financiado por políticas governamentais para uso e ocupação da região sob o discurso do desenvolvimento social. A Vale, como empresa pública na época, seguiu as diretrizes governamentais e implantou operações de mineração na região do Pará. Com a privatização do final da década de 1990 a Vale, na posição de empresa privada e alvo da fiscalização pública e da concorrência internacional passou a incorporar os princípios da sustentabilidade à sua estratégia, adequando suas operações aos mais rigorosos padrões existentes de respeito à natureza e aos stakeholders.

A Vale, pelo seu porte global, está mais exposta à opinião pública mundial. Os conflitos entre o que a empresa declara fazer e o que realmente é implantado levanta a dificuldade em se controlar de forma global e com os mesmos padrões, operações tão diversas, com pessoas de formações e aspirações tão diversas, em regiões também muito diversas. A atuação do Estado na região amazônica é levantada pela empresa como uma das causas dos conflitos com as comunidades locais que exigem da Vale o atendimento de demandas que seriam responsabilidade do Estado, como educação e saúde públicas.

Por fim, concluímos que ainda há muito que ser feito na região tanto pela Vale quanto pelo Estado, pois não se pode conceber que apenas um ator seja responsável pelo desenvolvimento sustentável de uma região do porte da Amazônia, seja ele o Estado seja ele uma empresa privada (como a Vale). O desenvolvimento sustentável requer uma nova forma de relacionamento entre os atores sociais, que não busque unicamente o ganho individual, mas o bem-estar coletivo, uma mudança central no sistema atual, argumento alinhado às reivindicações das negociações para minimização dos impactos da mudança climática.

Abstract

The global warming issue and all it´s impacts has expanded from Academia´s walls and penetrated all society at all decision´s levels, including great corporations and national governments around the globe, in order to find collective alternatives to minimize the climate change impacts.

This paper exposes the activity of the second world biggest mining company, Vale, in the Amazon area, one of the richest global bioma, fundamental to the climate maintanence, regural rain regime and the planet´s ecological balance but, it is also, one of the “victims” of deforestation due to it´s enormous area and to it´s valuable resources both above and beneath the soil.

This deforestation was, since the beginning, financed by public policies of use and ocupation of the region under de social development speech. Vale, as a public company back then, followed the governmental decision and started mining operations in Pará (one of the Amazonic states). When the company was privatized in the late 90´s, as a private company fiscallized by the public institutions and competing with international players in a globalized market, it has incorporated the principles of sustainability to it´s strategy, adapting it´s operations to the highest existing standards of respect to nature and stakeholders.

Vale, because of it´s global size, is more exposed to the global public opinion. The conflicts between what the company declares to do and what it really is implemented raise the discussion of how hard it is to control globally and according to the same standards so different operations, managed by so different people with so many different aspirations in so different areas around the planet. The role of the State is pointed by the company as one of the causes of the conflicts between the company and the communities that demand Vale the basic public services, as health and education, that are the State´s responsibility.

At the end, we conclude that there is a lot do be done both by Vale and the State because it is not acceptable that just one actor be responsible by the sustainable development of a whole region as the Amazon, be it the State or a private company (such as Vale). Sustainable development needs a new form of relation among it´s actors, that don´t pursue only individual goals but the collective welfare, a deep change in the system, according to the actual arguments used in the climate change international negotiations.

1. Introdução

A questão ambiental tem tomado espaço significativo nas discussões tanto no ambiente acadêmico, quanto no ambiente empresarial. É fato, hoje, que fenômenos e desastres naturais que vêm ocorrendo são decorrência do processo de aquecimento global, intensificado pela ação antropogênica, colocando a própria vida humana em perigo. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), órgão ligado à Organização das Nações Unidas, o termo mudança do clima refere-se a qualquer alteração climática ocorrida ao longo do tempo, devido à variabilidade natural ou decorrente da atividade humana. (IPCC, 2007)

Segundo esse mesmo órgão, as concentrações dos chamados gases de efeito estufa, que incluem dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, na atmosfera aumentaram bastante em consequência das atividades humanas desde 1750 e vêm ultrapassando valores pré-industriais determinados com base em registros no gelo há milhares de anos. Tal qual exposto pelo relatório, no que diz respeito ao aumento da concentração de dióxido de carbono, este se deve principalmente ao uso de combustíveis fósseis e à mudança no uso da terra, enquanto aumentos da concentração de metano e óxido nitroso são devidos às atividades agrícolas.

Assim, a conclusão chegada pela entidade é a de que o aquecimento global é indiscutível e evidente nas observações dos aumentos das temperaturas médias do ar e dos oceanos, do derretimento generalizado das calotas polares e da elevação do nível do mar. Este aquecimento do planeta, caso não sejam tomadas medidas adequadas para sua contenção, deverá ter efeitos perversos sobre a vida na Terra, sendo, de fato uma ameaça ao Homem. Toda a dinâmica de cultivo de alimentos, geração de energia e planejamento urbano deverá ser repensada nas próximas décadas levando em consideração este fenômeno que até o momento vem alarmando cientistas, governos e a sociedade civil.

É neste contexto que observamos as questões relacionadas à ocupação e devastação da região amazônica, região que abriga uma das maiores biodiversidades do planeta, e que hoje se vê ameaçada pela ação humana que, em nome do desenvolvimento, ocupa e desmata regiões onde predomina a floresta. O objetivo deste trabalho é, portanto, analisar ações de uma organização privada nesta região, apresentando o caso da empresa mineradora Vale, mostrando quais ações de combate ao desmatamento, às emissões de gases de efeito estufa e de outros impactos ambientais estão sendo realizadas por esta organização em suas operações na Amazônia. Desta forma, vale apresentar, também, o setor de mineração brasileiro e seus principais impactos ambientais. Nas próximas seções será trazido um breve referencial teórico sobre estas questões e, ainda, as principais considerações chegadas pelos autores, ao analisar o caso da organização em questão.

2. Referencial Teórico

2.1. Ocupação da Amazônia

A ocupação da Amazônia através de atividade econômica mais intensa e, consequentemente, maior nível de desmatamento, começou na década de 1970 devido aos incentivos fiscais concedidos – até a década de 1980 – pelo governo a fim de estimular a ocupação das terras e o desenvolvimento de atividades agropecuárias (FEARNSIDE, 2005).

Como descreve Fearnside (2005), as mudanças no cenário econômico -hiperinflação dos anos 1980 e seu fim na década de 1990, corte dos incentivos fiscais a partir da segunda metade da década de 1980 e sua proibição legal em 1991, desvalorização do valor das terras, expansão e globalização do setor de carne bovina, construção de infraestrutura de transportes através de planos federais (Avança Brasil e Plurianual) e a alta concentração de terras – justificam as oscilações na taxa de desmatamento da floresta (o desmatamento de 648,5 x 103 km2 da floresta no ano de 2003 é claramente muito maior que o desmatamento acumulado pré-1970 de 100 x 103 km2). É importante ressaltar que cerca de 75% do desmatamento é ocasionado em terras com mais de 100 hectares. Sendo assim, atividades exclusivas de combate à pobreza não conseguirão reduzir de forma significativa o desmatamento, uma vez que o mesmo ocorre em sua maioria em grandes latifúndios utilizados para produção de soja, engorda de gado ou mesmo especulação.

O desmatamento da floresta ocasiona diversos impactos como perda da produtividade do solo devido à erosão e compactação do solo e a perda dos nutrientes – que nem o uso de adubos consegue melhorar; mudanças no regime hidrológico (com diminuição das chuvas não só na região amazônica, mas em muitas outras regiões, como São Paulo em que dados preliminares apontam que 70% das precipitações do estado são provenientes do vapor de água da Amazônia) impactando, entre muitas coisas, na produção e fornecimento de energia uma vez que a matriz energética brasileira é principalmente hidrelétrica; perda incomensurável da biodiversidade da região (muitas espécies ainda nem catalogadas); e emissão de gases de efeito estufa a partir de queimadas (estima-se que a remoção da cobertura vegetal, em especial, na região amazônica gera aproximadamente uma emissão de 194 toneladas de carbono por hectare (T/ha) considerando tanto a parte aérea, quanto à subterrânea da camada vegetal existente na região amazônica, segundo estudo realizado por Salomão, Nepstad e Vieira (1998)).

Para combater tal desmatamento Fearnside (2005), assim como Goldemberg, Reis e Viana (2009), sugerem uma série de ações, como repressão através da aplicação do princípio de comando e controle pela intensificação do policiamento e fiscalização da região e das atividades econômicas realizadas no local aplicando, sempre que necessário, multas e penalidades; reforma política sobre os impostos, créditos e subsídios que desestimulem atividades de desmatamento (agropecuária, por exemplo) e promovam atividades de preservação (extrativismo e turismo ecológico, por exemplo); para a efetividade das ações anteriores é imprescindível a regularização dos títulos de posse das terras e uma profunda reforma na política de assentamento vigente (ocupando e revitalizando as áreas degradadas existentes minimizando a pressão de desmatamento sobre as áreas florestais primárias) e utilização de mecanismos econômicos existentes para pagamento por serviços ambientais prestados pela “floresta em pé”, como REDD e Créditos de Carbono.

2.2. Setor de mineração no Brasil e seus principais impactos ambientais

Com relação ao setor minerador, vale destacar que o mesmo é importantíssimo para o desenvolvimento socioeconômico de qualquer nação que possua em seu subsolo minérios, tendo sido esta importância reconhecida no encontro Rio+10, em Johannesburgo em seu relatório final. No Brasil, este setor representou, em 2000, 8,5% do PIB nacional (cerca de 50,5 bilhões de dólares) e gerou 500.000 empregos. Outra característica interessante do setor é que aproximadamente 95% de sua composição são de pequenas e médias mineradoras (FARIAS, 2002).

O setor brasileiro de mineração é regido por diversas leis, regulamentações, decretos e portarias nas três esferas do poder executivo (federal, estadual e municipal), assim como no Ministério Público (tanto federal, quanto estadual) sendo, em diversas situações, conflitantes as determinações destas normas. A princípio, todos os empreendimentos mineradores no Brasil devem apresentar e discutir de forma ampla e participativa (isto é, incluindo a sociedade civil) um estudo de impacto ambiental (EIA) e um relatório de impacto ambiental (RIMA) desenvolvido por técnicos habilitados para tanto (FARIAS, 2002).

Além dos inúmeros e complexos conflitos sociais gerados pela atividade mineradora, que devem ser muito bem abordados e trabalhados pelos gestores das empresas (saindo da simples visão do objetivo do acionista e dirigindo-se à visão de stakeholders, ou seja, de todos os públicos afetados pelas atividades da empresa: sociedade civil, comunidades tradicionais, governo e funcionários da empresa. Buscando sempre identificar as necessidades e anseios de cada um e tentar harmonizá-los minimizando, assim, os conflitos), os impactos ambientais podem ser divididos em quatro grupos, segundo Farias (2002): poluição da água, poluição do ar, poluição sonora e subsidência do terreno. As principais externalidades na produção de alguns minérios foram consolidadas por Farias (2002) no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1

PRINCIPAIS IMPACTOS AMBIENTAIS DA MINERAÇÃO NO BRASIL

Substância Mineral Estado Principais problemas Ações Preventivas e ou Corretivas
Ferro MG Antigas barragens de contenção, poluição de águas superficiais Cadastramento das principais barragens de decantação em atividade e as abandonadas; Caracterização das barragens quanto a estabilidade; Preparação de estudos para estabilização
Ouro PA Utilização de mercúrio na concentração do ouro de forma inadequada; aumento da turbidez, principalmente na região de Tapajós. Divulgação de técnicas menos impactantes; monitoramento de rios onde houve maior uso de mercúrio.
MG Rejeitos ricos em arsênio; aumento da turbidez. Mapeamento e contenção dos rejeitos abandonados
MT Emissão de mercúrio na queima de amálgama Divulgação de técnicas menos impactantes.
Chumbo, Zinco e Prata SP Rejeitos ricos em arsênio Mapeamento e contenção dos rejeitos abandonados
Chumbo BA Rejeitos ricos em arsênio Mapeamento e contenção dos rejeitos abandonados
Zinco RJ Barragem de contenção de rejeito, de antiga metalurgia, em péssimo estado de conservação. Realização das obras sugeridas no estudo contratado pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Carvão SC Contaminação das águas superficiais e subterrâneas pela drenagem ácida provenientes de antigos depósitos de rejeitos. Atendimento às sugestões contidas no Projeto Conceitual para Recuperação da Bacia Carbonífera Sul Catarinense.
Agregados para construção civil RJ Produção de areia em Itaguaí/Seropédica: contaminação do lençol freático, uso futuro da terra comprometido devido a criação desordenada de áreas alagadas. Disciplinamento da atividade; Estudos de alternativas de abastecimento.
SP Produção de areia no Vale do Paraíba acarretando a destruição da mata ciliar, turbidez, conflitos com uso e ocupação do solo, acidentes nas rodovias pelo causados transporte. Disciplinamento da atividade; Estudos de alternativas de abastecimento e de transporte.
RJ e SP Produção de brita nas Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro e São Paulo, acarretando: vibração, ruído, emissão de particulado, transporte, conflitos com uso e ocupação do solo. Aplicação de técnicas menos impactantes; Estudos de alternativas de abastecimento.
Calcário MG e SP Mineração em áreas de cavernas com impactos no patrimônio espeleológico. Melhor disciplinamento da atividade através da revisão da Resolução Conama nº. 5 de 06/08/1987.
Gipsita PE Desmatamento da região do Araripe devido a utilização de lenha nos fornos de queima da gipsita. Utilização de outros tipos de combustível e incentivo ao reflorestamento com espécies nativas.
Cassiterita RO e AM Destruição de Florestas e leitos de rios Racionalização da atividade para minimizar os impactos

Fonte: Farias, 2002.

É importante ressaltar também que além dos conflitos sociais que poderão ocorrem no processo de implementação da mina, dos problemas ambientais que devem ser trabalhados durante sua vida útil, é também fundamental o planejamento e a correta execução do fechamento das minas exauridas, previsto na Constituição Federal de 1988 e regulamentada pelo Decreto nº. 97.632 de abril de 1989, onde é definida como responsabilidade do minerador que explorou a área a recuperação do meio ambiente degradado, respeitando todos os requisitos legais da alteração de forma de uso da terra (FARIAS, 2002).

Todos os desafios apresentados por esse autor como a grande quantidade de regulamentações conflitantes e a urgente necessidade de desenvolvimento da estrutura de Estado (federal, estaduais e municipais) tanto para fiscalização quanto análise dos pedidos de novas minas e/ou fechamento das mais antigas, fazem com que para as grandes mineradoras (5% do setor) os custos sejam elevados (mas não impraticáveis devido ao corpo funcional altamente qualificado) e para os pequenos e médios mineradores sem recursos suficientes reste apenas desrespeitar a legislação, aumentando ainda mais os problemas ambientais na região.

3. Metodologia

Conforme definido por Sampieri et al (2006, p. 6), uma pesquisa qualitativa é realizada através de uma coleta de dados sem medição numérica para desenvolver ou aperfeiçoar o problema de pesquisa, de maneira que o atual trabalho segue tal definição. Já com relação à sua classificação, a pesquisa pode ser considerada exploratória, tendo procurado especificar as propriedades, características e perfis importantes de pessoas, grupos, comunidades ou qualquer outro fenômeno que se submeta a análise (DANKE, 1989 apud SAMPIERI et al, 2006, p. 101).

Foram utilizados dados secundários obtidos através de pesquisa bibliográfica em periódicos, anais de congressos, informativos corporativos e endereços eletrônicos para a composição do referencial teórico do trabalho e identificação do caso. Para esta última etapa mencionada, também foram utilizados dados primários. Assim, o presente trabalho consiste em um estudo de caso, o qual, segundo definição de Yin (2005), consiste na investigação de um fenômeno dentro de seu contexto.

A escolha do caso foi feita com base no posicionamento da empresa no seu setor de atuação, destaque do setor nas questões ambientais atuais, disponibilidade de dados secundários e de dados primários quando necessários e, por fim mas não menos importante, expressividade da empresa quanto ações de sustentabilidade em suas operações.

A partir destas fontes chegou-se ao caso da empresa Vale, objeto do presente estudo. Para a obtenção de informações sobre a empresa, de modo que fosse possível realizar a análise, foi entrevistado um empregado de nível superior da Vale, que solicitou anonimato, com mais de 8 anos de empresa, tendo trabalho cerca de 5 anos na área de Meio Ambiente e há três como gestor de uma das áreas de operação no Pará. As entrevistas foram feitas pessoalmente, através da aplicação de um questionário semiestruturado, seguido pelos autores, tal qual consta no Anexo 1 do trabalho.

4. O caso

Nas próximas sessões será trazido um breve histórico da Vale, empresa escolhida para o estudo de caso, conforme mencionado anteriormente, além de apresentar as principais ações da empresa na região amazônica, trazendo, também, os principais pontos relevantes identificados ao longo das entrevistas realizadas junto à organização.

4.1. Vale: histórico

A Vale foi criada pelo Decreto-Lei 4.352 pelo então presidente Getúlio Vargas em 1º de junho de 1942 como uma sociedade anônima de economia mista e nome Companhia Vale do Rio Doce; somente em 11 de janeiro de 1943 que é reunida a Assembléia de constituição definitiva da Vale aprovando o estatuto da empresa e definindo sua sede administrativa em Itabira (MG). Com apenas 5 anos de atividade, em 1949, a Vale se torna responsável por 80% das exportações brasileiras de minério de ferro e no mesmo ano cria o Centro de Estudos Ferroviários, em Vitória (ES). Em 1952, o governo federal assume o controle definitivo do sistema operacional da Vale que será privatizada em 1.997. A seguir, alguns pontos importantes da história da Vale na região amazônica (VALE, 2007a):

Em 1967, geólogos da Companhia Meridional de Mineração, subsidiária da United States Steel Corp., constatam a ocorrência de minério de ferro em Carajás (PA), e, três anos depois em 1970, através de um acordo com a US Steel Co., a Vale se torna sócia majoritária do empreendimento em Carajás (PA).

Onze anos depois, em 1981, são realizadas as primeiras detonações para abertura de mina e a mudança da primeira família para Carajás; quatro anos depois, é entregue a Estrada de Ferro Carajás (EFC) à Vale pela empreiteira Rodominas e é inaugurado o Projeto Ferro Carajás aumentando a capacidade produtiva da Vale – neste momento, estruturada em dois sistemas logísticos Norte (em torno da EFC) e Sul (Valesul). No ano seguinte, 1986, é inaugurado o terminal portuário de Ponta da Madeira, em São Luís no Maranhão.

Já no século XXI, em maio de 2002, é lançada a pedra fundamental do Projeto de Cobre do Sossego (PA) e em julho do mesmo ano, a operação de Carajás completa 35 anos comemorando a produção recorde da Vale de 5 milhões de toneladas de minério ferro. Dois anos depois, em julho de 2004, é inaugurada em tempo recorde a mina do Sossego, a primeira mina de cobre do Brasil que teve 73% de sua mão de obra local. A previsão é que, em 2010, os projetos de cobre da Vale já estejam produzindo 650 mil toneladas anuais. No ano seguinte, a produção de Sossego totalizava 107 mil toneladas de cobre em concentrado atendendo a 13 clientes diferentes em 11 países e é expandida e melhorada a infraestrutura da EFC.

4.2 Operações da Vale na Amazônia e projetos de sustentabilidade

As atividades da Vale na região amazônica são muito antigas, mas estão à vanguarda das práticas de sustentabilidade em mineração em conformidade com o posicionamento estratégico da empresa quanto ao desenvolvimento sustentável, como descrito a seguir e disponível na página virtual da empresa e em seus relatórios anuais.

A empresa descreve o seu negócio com a palavra “transformação”, pois “na atividade de mineração, transforma-se recursos minerais existentes na terra em desenvolvimento sustentável. Eles se tornam componentes de produtos essenciais para o dia a dia de todos, como aparelhos eletroeletrônicos, automóveis, computadores, materiais de construção civil e insumos agrícolas”. Cientes da responsabilidade que possuem, atuam de forma responsável, tendo cuidado com o meio ambiente, respeitando a diversidade cultural e ajudando a desenvolver as comunidades próximas às áreas de atuação da Vale. As área de negócio da Vale são organizadas em: Pesquisa Mineral, Minério de Ferro e Pelotas, Níquel, Carvão, Alumínio, Potássio, Cobre, Manganês e Ferroligas, Caulim, Siderurgia, Logística e Energia (VALE, 2007b).

A questão da sustentabilidade está incorporada nos valores da empresa, em seus princípios, estratégias e objetivos, como declara a empresa, “para a Vale, Desenvolvimento Sustentável acontece quando a atividade econômica gera valor ao acionista e contribui para o bem-estar da sociedade e para a conservação dos ecossistemas no nível territorial e global. A transformação de recursos minerais em desenvolvimento social, prosperidade econômica e sustentabilidade ambiental se dá por meio de parcerias com governos, empresas e a sociedade civil”. A empresa busca manter um diálogo contínuo com as partes interessadas, com o objetivo de maximizar a contribuição para o desenvolvimento socioeconômico das regiões onde atua, conservando o meio ambiente e deixando um legado positivo de desenvolvimento social, econômico e ambiental. “Atuamos com consciência e responsabilidade socioeconômica e ambiental, desde a fase de pesquisa mineral, concepção e implantação de projetos até o fechamento das minas, buscando melhorias contínuas em nossos processos e investindo em novas tecnologias. Nas regiões onde atuamos, contribuímos para o fortalecimento das instituições locais e apoiamos o desenvolvimento da infraestrutura e da economia. Além disso, apoiamos diversas iniciativas globais, colaborando com o entendimento e a busca de soluções para questões globais prementes, como aquecimento global, pesquisa de energias renováveis e conservação da Amazônia” (VALE, 2007c).

O meio ambiente é componente fundamental na qualidade dos produtos e serviços da Vale. A empresa se compromete com o conceito de desenvolvimento sustentável, que visa ao equilíbrio entre a proteção do meio ambiente e a necessidade de crescimento econômico, conforme sua Política de Meio Ambiente.

A empresa interage com a natureza em busca de matérias-primas que são transformadas em ingredientes essenciais ao nosso dia a dia, como uma mineradora global ciente de sua grande responsabilidade, trabalham para que os pilares da sustentabilidade estejam incorporados nas práticas, nas atitudes dos empregados e em toda rede de fornecedores.

O compromisso com a sustentabilidade pode ser comprovado pelas medidas de conservação, proteção e recuperação ambiental que asseguram a manutenção e o resgate dos ecossistemas onde a Vale atua. Essas medidas contribuem para o desempenho do Sistema de Gestão da Qualidade Ambiental (SGQA), baseado nas diretrizes ISO 14001, que fornece ferramentas para gerir os aspectos ambientais relacionados às atividades, produtos e serviços (VALE, 2007d).

A Vale atua com responsabilidade e respeito aos requisitos ambientais legais. A política de investimentos da empresa gerou crescimento substancial dos recursos aplicados em controles ambientais, cujos principais investimentos recentes em controle ambiental na região amazônica são (VALE, 2007e):

  • Realização de projetos de segurança, alteamento, dragagem, drenagem e reabilitação ambiental de barragens de rejeitos e pilhas de estéril nas minas de ferro da região Sudeste do Brasil e de Carajás, no Estado do Pará;
  • Melhoria no sistema de disposição/tratamento/transporte de resíduos, melhoria no controle de emissões atmosféricas e implantação de sistema de tratamento de gases nas operações da cadeia do alumínio, no Estado do Pará;
  • Início de projetos de revegetação e reflorestamento na região Norte do Brasil (dentro do compromisso anunciado em setembro de 2007 do plantio de 346 milhões de árvores até 2010, o maior projeto de revegetação e preservação ambiental na América Latina).

A gestão de resíduos é uma preocupação permanente da empresa em seu compromisso com a conservação do meio ambiente. O Programa de Gestão de Resíduos, instituído em todas as unidades a partir de 2002, visa a minimizar a geração e racionalizar a destinação final dos resíduos, estimulando a reciclagem, a reutilização, o coprocessamento e, em último caso, a disposição em aterros controlados da própria Vale, como exemplos pode-se citar (VALE, 2007f):

  • A realização de atividades de reciclagem e reutilização de produtos em duas unidades da Vale que transformam alumina em alumínio, utilizando produtos derivados de materiais secundários para refusão. A Valesul, no Estado do Rio de Janeiro, reinsere em seu processo produtivo materiais pós-consumo (latas de alumínio, por exemplo) e refugos industriais provenientes de outras atividades. Por sua vez, a Albras, no Estado do Pará, reutiliza somente refugos industriais. As duas empresas possuem também a reciclagem interna, ou seja, a reutilização de sucata interna, que é novamente fundida. O reaproveitamento externo busca diminuir os gastos de produção característicos do negócio, reduzir o volume de matéria-prima necessário no processo industrial e ampliar a capacidade de produção;
  • Uma das iniciativas internas inovadoras que gerou maior eficiência na gestão de resíduos foi a consolidação das áreas para armazenamento temporário de resíduos, que se deu por meio da implantação das Centrais de Materiais Descartados (CMDs). As CMDs contribuíram para melhorar o desempenho na destinação de resíduos, inclusive os perigosos, minimizando os riscos envolvidos no processo devido à operacionalização de contratos com empresas especializadas. Além disso, viabilizaram maior ganho de escala para o aproveitamento energético dos resíduos e;
  • Outra iniciativa importante foram os convênios firmados com universidades e centros de pesquisa, por meio deles, foram financiados a pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias de reutilização de resíduos, além de promover a implantação de unidades de reprocessamento de resíduos nos territórios onde a Vale atua, priorizando a contratação de mão de obra local.

Outra ação da empresa foi quanto à gestão de recursos hídricos, através da implantação do Sistema de Gestão de Recursos Hídricos, que busca assegurar a conformidade legal e o uso racional da água, que é regido pela Política de Gestão de Recursos Hídricos da Vale e cujas principais ações relacionadas ao uso eficiente da água são (VALE, 2007g):

  • Aplicação do diagnóstico de uso dos recursos hídricos em todas as unidades no Brasil;
  • Estudo de disponibilidade hídrica regional, realizado nas unidades de Carajás (no Pará), no Complexo Portuário de Ponta da Madeira (no Maranhão) e no Complexo Portuário de Tubarão (no Espírito Santo), que identifica situações de risco de desabastecimento e os impactos da captação nas fontes hídricas. O objetivo final é racionalizar e minimizar o impacto hídrico nos territórios onde a empresa atua. Esse estudo será estendido às demais unidades da Vale;
  • Desenvolvimento do Sistema de Informações Ambientais (SIA), destinado a armazenar os dados da gestão hídrica.

Como exemplos reais destas ações pode-se citar: • reaproveitamento da água e gestão hídrica que busca principalmente a melhoria dos sistemas de reaproveitamento e o tratamento da água utilizada. Para tanto, são estabelecidas metas de implementação de programas de redução de consumo e programas de recirculação e reutilização da água em todas as unidades operacionais e; • barragens e pilhas, um processo que está fundamentado nas melhores práticas vigentes relacionadas às etapas de projeto, construção, operação, manutenção e fechamento. Além de observar as normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), respeitam-se os manuais e publicações do Comitê Brasileiro de Grandes Barragens (CBGB) e da International Commission on Large Dams (Icold) e estudam-se casos relatados em publicações especializadas.

Para antecipar problemas, a Vale estabeleceu diretrizes corporativas com foco na atuação preventiva, que orientam as áreas operacionais. A ideia é unificar procedimentos e promover a sistematização adequada do fluxo de informações, instituindo um banco de dados específico sobre o tema. Além disso, foi criado um comitê interno, o Grupo Temático de Geotecnia e Hidrogeologia (GTGH), a fim de garantir os procedimentos necessários. O GTGH é composto por profissionais que se reúnem cada dois meses ou quando há necessidade de avaliar situações atípicas. O grupo prioriza a aprendizagem coletiva e compartilhada de temas-chave para as operações da Vale.

A energia é essencial, em suas diversas formas e origens, para os negócios da Vale. Por meio da gestão do consumo de energia, mapeia-se consumo, fontes e alternativas, a fim de garantir suprimento de forma competitiva e sustentável e prover soluções estratégicas para a matriz energética da Vale. Também se procura desenvolver oportunidades de uso de combustíveis alternativos e há o empenho em descobrir soluções que melhorem a eficiência energética.

A gestão do consumo de energia é desenvolvida em diversas áreas da Vale, com projetos de melhoria nos equipamentos e processos. O objetivo é obter mais eficiência, reduzindo o consumo e, consequentemente, as emissões indiretas e os custos de produção.

De forma pioneira, a Vale tem testado e utilizado o biodiesel em diversas unidades do Brasil, visando à substituição de outros insumos combustíveis, como o diesel tradicional, nas operações. Também foi testado, com sucesso, o uso de B20 nas ferrovias (VALE, 2007h).

A empresa possui diretrizes corporativas específicas para gestão das principais questões relacionadas com os impactos das mudanças climáticas nos negócios e para estabelecer mecanismos de controle e redução de emissão de gases de efeito estufa que devem ser aplicadas em todas as áreas da Vale, suas subsidiárias e sociedades controladas dentro e fora do Brasil devendo ser incentivada a implantação também pelas coligadas (VALE, 2007i).

O grande desafio atual da humanidade é continuar a suprir as necessidades da população crescente e das gerações futuras em um cenário no qual os recursos naturais são cada vez mais escassos. Para a Convenção da Diversidade Biológica (CDB), que reúne 175 nações, diversidade biológica significa a preservação da variedade de organismos vivos de todas as origens, incluindo o homem. É dessa forma que a Vale vê esta questão e com esta visão que está comprometida (VALE, 2007j).

A mineração é uma indústria transformadora e, por suas características intrínsecas, pode acarretar impactos sociais e ambientais significativos. A Vale reage a isso com uma constante contribuição de ideias para a definição de políticas públicas que minimizem os efeitos da sua atividade no meio ambiente, tendo consciência de seu papel fundamental e estratégico na Política Nacional da Biodiversidade e sua interface com o Código Mineral. Isso ocorre devido à amplitude dos programas voltados para conservação dos biomas, manutenção de bancos de germoplasma e implantação e manutenção de herbários e viveiros da empresa.

No trabalho de restauração de habitats, os Princípios da Sucessão Ecológica são seguidos, no qual as áreas podem ser reabilitadas ou restauradas. O diagnóstico de cada situação permite decidir pela técnica mais adequada e considerar as necessidades de reconformação morfológica do terreno e o estabelecimento de estruturas de contenção e drenagem.

A empresa protege ou ajuda a proteger, por meio de parcerias, 27 habitats destinados à conservação da biodiversidade no Brasil: 21 de sua propriedade e seis sob jurisdição de órgãos federais. A maior parte dessas áreas protegidas localiza-se no Bioma Amazônia; o restante, no Bioma Mata Atlântica.

O tema biodiversidade é tão inserido na realidade da Vale que, em 2000, foi criado o Instituto Ambiental Vale (IAV), que tem estrutura organizacional independente e desenvolve diversos projetos ambientais em diferentes regiões do Brasil. Em 2006, o IAV desenvolveu 100 projetos para as unidades operacionais da Vale, atendendo a demandas distintas de serviços e atividades de gestão ambiental dos ecossistemas em que há operações.

Uma das peculiaridades do quadro técnico do IAV é contar com empregados que já dispunham de vasto conhecimento empírico sobre biodiversidade e que vêm sendo preparados para atuar em conjunto com profissionais de diversas áreas. Os “mateiros” são bom exemplo, profundos conhecedores da floresta, eles foram treinados para trabalhar como identificadores botânicos juntamente com engenheiros florestais e biólogos do IAV.

O IAV está a serviço das unidades da Vale, das empresas controladas e coligadas e também da sociedade em geral. Entre suas atividades estão o desenvolvimento de projetos de reabilitação, o paisagismo urbano e planos de manejo de unidades de conservação, além de recuperação de nascentes e matas ciliares de rios. O Instituto é responsável pela administração de todos os parques botânicos e áreas de conservação mantidos pela Vale (VALE, 2007k).

A educação ambiental também é tratada como condição fundamental para garantir o exercício da sustentabilidade. Desde 2001, a Vale está se organizando para estruturar um programa que faça sentido para empregados, contratados e comunidades. Os projetos específicos em cada unidade operacional são normalmente demandas vinculadas às liberações de licenças ambientais. A Vale entende seu papel como agente do desenvolvimento local e acredita que a educação formal e ambiental inserida nos currículos das diversas disciplinas e séries é uma prerrogativa do Estado.

Em 2002, foram propostas as primeiras diretrizes para educação ambiental na empresa. Entre 2004 e 2006, foram estruturados os projetos-piloto do Programa Atitude Ambiental nos complexos ferríferos de Minas Gerais; na mina de cobre do Sossego, em Canaã dos Carajás (PA), e nas áreas de porto e pelotização em Tubarão (ES) (VALE, 2007l).

Projetos-piloto:

  • Minas Gerais: o programa já alcançou 23 mil empregados e contratados de 30 localidades. A participação da comunidade é feita por meio do trabalho com duas escolas públicas por município, além da presença de lideranças e associações comunitárias nas reuniões. Em 2007, cerca de oito mil pessoas, entre empregados, contratados e outros integrantes da comunidade, envolveram-se com o programa, participando de reuniões de apresentação e oficinas de arte, educação e reciclagem, entre outras atividades. O programa Atitude Ambiental organizou o plano de gestão dos Centros de Educação Ambiental, onde são desenvolvidas as atividades do programa, tais como Oficinas do Conhecimento Ambiental e discussões sobre atitude, comprometimento e capacitação dos difusores do meio ambiente.
  •  Canaã dos Carajás: o Atitude Ambiental foi implantado, em 2002, em toda a rede municipal de ensino da 1ª à 4ª série. O programa é focado na capacitação dos professores em oficinas temáticas de língua portuguesa e matemática, onde são inseridos temas ambientais. No primeiro ano da oficina de matemática, as escolas escolheram o tema “Águas e Abastecimento”. As 13 escolas participantes mapearam o caminho das águas em seus bairros e na cidade de Canaã, discutiram a localização de fossas sépticas, desenharam e criaram uma maquete da área servida por água e esgotos ou fossas, entre outras atividades. O resultado foi tão positivo que o prefeito solicitou que o programa fosse estendido a professores e alunos de 1ª à 9ª série.
  •  Tubarão: o terceiro projeto-piloto foi implantado em 2006, no complexo de Tubarão, em Vitória (ES). A metodologia está focada na troca de conceitos e informações sobre sustentabilidade e na discussão sobre posturas inovadoras em atitudes cotidianas. Também são trabalhados temas relacionados à convivência entre as pessoas e práticas para consumo consciente e recuperação dos ambientes urbanos interferidos. Cerca de três mil empregados e contratados participaram do primeiro ano do projeto. Até 2008, a meta é alcançar 15 mil pessoas, considerando a expansão das atividades da Vale na região.

A Vale busca contribuir não apenas como agente econômico, mas como promotores da sustentabilidade social e ambiental, da cidadania e do engajamento de partes interessadas em cada território com o qual interage, colocando a sua capacidade de articulação em prol da integração dos diversos públicos, pois a participação de todos é fundamental para o desenvolvimento sustentável dos territórios (VALE, 2007m).

Para alcançar esse objetivo, utiliza-se como preceitos:

  • Conformidade com a legislação: todas as obrigações legais são cumpridas;
  • Minimização dos impactos negativos: investimentos em ações que vão além das obrigações legais;
  • Maximização dos impactos positivos: gestão da cadeia de valor para maximizar os efeitos positivos da atuação;
  • Desenvolvimento sustentável territorial: a partir das vocações e necessidades da localidade, estabelecimento de uma articulação integrada com diversos agentes na definição de planos de ação, potencializando as dinâmicas de crescimento e de diversificação econômica, promoção social e conservação ambiental.

A identificação dos impactos socioeconômicos, direitos e indiretos, nos territórios onde atua foi aprimorada pela realização de diagnósticos conduzidos por especialistas independentes. Com esses estudos, a empresa passou a conhecer melhor a realidade local, viabilizando a sua real contribuição com o planejamento integrado regional. Os diagnósticos buscam construir uma abordagem global e integrada do território, que contempla a realidade atual e, em alguns casos, a visão de futuro nas dimensões histórica, demográfica, econômica, social e urbana. De 2005 a 2007, foram concluídas a realização de diagnósticos nas seguintes regiões brasileiras: sudeste do Pará, Quadrilátero Ferrífero (MG), Grande Vitória (ES) e Centro-Sul do Rio de Janeiro. No Peru (Projeto Bayovar) e em Moçambique (Projeto Moatize), o trabalho priorizou aspectos socioculturais (VALE, 2007n).

O objetivo deste trabalho de gestão integrada com a comunidade é promover em todos os empreendimentos da Vale, diversos impactos positivos diretos nas comunidades onde atua, tais como:

  • Capacitação profissional;
  • Geração de empregos diretos;
  • Aumento da receita pública, por meio do pagamento de impostos;
  • Contratação de serviços e produtos de fornecedores locais e;
  • Investimentos em infraestrutura.

Por meio dos diagnósticos, também são identificados os principais impactos indiretos positivos, dentre os quais se destacam:

  • Aumento da produção, emprego e massa salarial dos setores não minerais, em decorrência da maior renda gerada;
  • Ampliação das compras de insumos e a elevação da arrecadação tributária municipal advinda de outros setores;
  • Capacitação de trabalhadores locais;
  • Qualificação de fornecedores e;
  • Melhoria da infraestrutura.

A experiência demonstra que a Vale tem como potencializar esses impactos positivos por meio de diretrizes que priorizam as compras locais, compartilham o conhecimento com as comunidades e apóiam o desenvolvimento com investimentos sociais em infraestrutura e serviços.

Outra maneira para garantir que a Vale administra de forma cuidadosa e respeitosa os espaços naturais onde trabalha, é a utilização de tecnologia geográfica como ferramenta básica para análises e avaliações. A Vale é pioneira na utilização das geotecnologias no Brasil. Na década de 80, introduziu o geoprocessamento no planejamento e na execução de projetos de exploração mineral, com o uso do sensoriamento remoto (VALE, 2007o).

Investe continuamente na aquisição de equipamentos e na manutenção das melhores práticas disponíveis no mercado de geoinformação. Dessa forma, torna-se possível agregar valor às atividades, viabilizando ações consistentes, baseadas em Sistemas de Informação Geográfica. Utiliza diversos produtos e serviços, como tecnologia GPS, fotografias aéreas em várias escalas, perfilamentos a laser, dados geográficos multifontes e imagens orbitais e aerotransportadas por sensores. A expansão do acervo geográfico levou e empresa a implantar, em Vitória (ES), o Geodata Center, um ambiente de Tecnologia da Informação para SIG, criando uma base de dados centralizada utilizada por todas as unidades.

Estes Sistemas de Informação Geográfica (SIG)possui três grandes grupos:

  • SIG Territorial: sistema corporativo que mantém um banco de dados centralizado de informações geográficas disponível para toda a empresa;
  • SIG Mineral: integra a área de mineração e organiza os diversos dados técnicos. A fonte de dados é uniformizada, otimizando rotinas, auxiliando a gestão estratégica e buscando eficiência nos trabalhos de gerências operacionais e;
  • SIG Ferrovias: sistema baseado nos padrões do SIG Territorial. Auxilia na gestão de ocorrências ferroviárias e na gestão de riscos por meio da identificação e caracterização de trechos críticos.

Para reduzir ao mínimo os riscos ambientais e garantir a segurança dos projetos, a Vale busca estabelecer uma gestão de riscos eficiente e moderna. Utilizando procedimentos técnicos, pessoal capacitado, consultorias especializadas e auditorias periódicas, além de organizar grupos que compartilham as melhores práticas.

No desenvolvimento de um projeto, integra-se disciplinas como engenharia, meio ambiente, saúde e segurança, sempre buscando o comprometimento das partes interessadas. As questões de sustentabilidade são analisadas de modo a permitir aprimoramento contínuo desde o processo de desenho e planejamento.

Em 2007, foi constituída uma equipe para avaliar os riscos decorrentes do aquecimento global sobre as operações da empresa e os territórios onde atua. Esse estudo, baseado nas recomendações do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão das Nações Unidas, está em desenvolvimento (VALE, 2007p).

Na Vale, a abordagem de risco se dá em três níveis:

  • Corporativo: estruturado com base nos temas Mercado, Crédito, Operacional ou Estratégico;
  • Unidades de negócios: a gestão de riscos é realizada durante o planejamento estratégico anual e, para novos projetos, por meio da metodologia de desenvolvimento de projetos Front-End-Loading (FEL) e;
  • Operacional: o monitoramento permanente dos riscos e das oportunidades é realizado por equipes locais das áreas de saúde e segurança, ambiental, social, operacional e patrimonial.

Quanto à relação com o governo, há muitos anos, a Vale participa de importantes comitês, associações e fóruns empresariais. Faz parte, por exemplo, do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), criado em 2003 para assessorar o presidente da República na formulação de políticas e diretrizes que viabilizem o desenvolvimento de projetos sociais de longo prazo.

Os conselheiros do CDES têm como desafio articular diversas representações da sociedade civil, a fim de efetivar reformas necessárias ao crescimento do País.

A Vale também é (VALE, 2007q): • associada ao Instituto Ethos de Responsabilidade Social; • integrante do Conselho de Responsabilidade Social da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan); • fundadora do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável; • integrante do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável; • associada ao Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife); • associada à Federação das Fundações dos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo; • signatária do Pacto Global (ONU); • signatária do ICMM – International Comitee for Mining and Metals; • associada ao CEDBS – Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável.

Em relação ao relacionamento com as comunidades (VALE, 2007r), a Vale vê o diálogo social como um processo permanente e sistematizado, que requer proatividade e conhecimento mútuo e perpassa todos os negócios e todas as fases dos empreendimentos — desde os estudos de viabilidade até os processos de encerramento de atividades.

Com a expansão global da Vale, mais um desafio se impõe à comunicação com as comunidades: a perspectiva multicultural. Cada vez mais, os empreendedores, em todo o mundo, precisam de licença social para operar. As audiências públicas são previstas pela legislação ambiental em vários países, e cabe às organizações envolver adequadamente as comunidades nesse processo.

Engajar, por exemplo, os líderes comunitários de Moatize — região de Moçambique onde a Vale realizou estudos de viabilidade visando à exploração de carvão mineral — requer, entre outros aspectos, saber expressar-se nos idiomas e dialetos regionais, considerar a tradição oral em detrimento da linguagem escrita e interagir com os régulos, anciões que traduzem os valores das comunidades locais.

Nos territórios onde opera, existem canais e instrumentos de diálogo que têm por objetivos integrar, aproximar, promover o esclarecimento e o entendimento, e encaminhar questões levantadas pelas comunidades. Os projetos que visam a manter uma comunicação contínua entre a empresa e as comunidades estão agrupados no programa Vale Comunidade. Para citar alguns exemplos, temos

  • o Encontro com Lideranças, um projeto que busca estabelecer canal permanente de comunicação com os líderes comunitários;
  • o Cidadania nos Trilhos, que envolve trabalho pedagógico nas escolas, inclusive qualificação de professores;
  • o Terças no Museu que oferece a escolas atividades relacionadas ao transporte ferroviário e à educação ambiental;
  • o Trem da Cidadania que presta serviços básicos a populações de baixa renda e;
  • o Vale Comunidade – Visitas que gera aproximação com os moradores das cidades onde a empresa opera.

Por fim, existe a Fundação Vale (VALE, 2007s) que busca contribuir com o desenvolvimento dos territórios onde a Vale está presente, de forma a fortalecer as pessoas e as comunidades, sempre respeitando as identidades culturais locais, isso é feito defendendo causas nas quais a empresa acredita: melhoria da qualidade de vida, fim do analfabetismo, educação de qualidade para todos, acesso à cultura, contribuição com a gestão pública, aumento das oportunidades de trabalho e renda, tudo isso se reflete nos programas e no trabalho que a fundação faz.

Esse é um desafio que obriga a Vale a conhecer cada território e seu povo, seus hábitos, anseios e oportunidades. Para isso, a Fundação Vale promove estudos aprofundados, verdadeiros diagnósticos, que revelam as realidades onde a empresa atua. Esse estudo amplo e complexo dá segurança para construir um trabalho de longo prazo, sustentado no tempo e implementado em parceria com o poder público e a sociedade civil organizada visando a contribuir para a solução das questões prioritárias de cada território, com mais justiça e inclusão social. Como declara a empresa “defendemos essas causas para que ao final possamos assistir ao desenvolvimento integrado das comunidades onde estamos”.

5. As Ações de Sustentabilidade sob outro olhar

A fim de identificarmos a aderência das ações divulgadas pela Vale junto à comunidade, foi feita uma busca na internet, uma vez que a pesquisa de campo não era nem economicamente nem operacionalmente (divido ao tempo, principalmente) viável, e dentre as notícias encontradas destacamos as seguintes:

A Vale tem sido recentemente acusada – tanto na mídia quanto no próprio Congresso Nacional – de usar seu poder econômico para subjugar os poderes Executivo e Judiciário e ameaçar a população que questionar suas políticas na região norte do Brasil.

Em documentos divulgados na Internet (Agência Senado, 2009 e Correio da Cidadania, 2009) as informações são que as pessoas que questionam as políticas da empresa geralmente causadoras de desmatamento e exclusão, são, por sua vez, excluídas dos programas sociais da empresa – frequentemente a única fonte de renda da região – e que o poder público, subserviente ao poder econômico da empresa não toma nenhuma medida.

A Vale também é acusada de manter relações comerciais com empresas que não agem segundo a política ambiental da Vale (declarada como documento necessário para manutenção das parcerias) e que estão envolvidas em processos judiciais por utilização de mão de obra escrava.

Esta situação é assim resumida pelo senador José Nery (líder do PSOL):

“Esse fato deixa claro que existe uma distância considerável entre a cara e a bonita propaganda da Vale do Rio Doce, onde todos os brasileiros são induzidos a concebê-la como modelo de desenvolvimento sustentável e apoio a projetos sociais, e a verdadeira face conhecida pelo povo pobre do Pará: autoritarismo, danos ambientais, ingerência política e controle econômico de estruturas que deveriam estar apoiando seus eleitores e não seus financiadores”.

Outro grupo que já se posicionou muito contrário à Vale foi uma parte dos clérigos da Igreja Católica (Repórter do Brasil, 2007) quando, em 2007, a Confederação Nacional dos Bispos (CNBB) aceitou que a empresa financiasse a Campanha da Fraternidade (CF) daquele ano cujo tema era ‘Fraternidade e Amazônia – Vida e missão neste chão’. O motivo da manifestação está bem claro no trecho do manifesto assinado por diversas organizações católicas que atuam na região:

“(…) Entre o discurso do texto-base e a prática manifestada no ato de lançamento da Campanha, há uma contradição muito grande. A organização do lançamento foi entregue a uma empresa de eventos. O lançamento será numa ilha. A participação no mesmo será restrita aos que tiverem convites. (…) O povo, apresentado como centro no texto-base, com sua rica diversidade de culturas e religiões, onde estará? (…) O mais grave, no nosso entender, é que este lançamento seja patrocinado pela Companhia Vale do Rio Doce, que é uma das principais responsáveis pela destruição ambiental e por conflitos com as populações tradicionais da Amazônia. (…) A Vale tem viabilizado a construção de uma série de siderúrgicas que utilizam o carvão vegetal para a produção do ferro-gusa. Segundo o cálculo de ambientalistas e de outros estudiosos, são praticamente 300 mil hectares de floresta primária que, a cada ano, são destruídos para a produção de carvão. Algumas dessas siderúrgicas já foram flagradas e multadas pela fiscalização do Ministério do Trabalho por manter centenas de trabalhadores como escravos em suas carvoarias, inclusive crianças. Como é possível que a CNBB aceite o patrocínio de uma empresa como esta para o lançamento de uma Campanha que quer chamar a atenção para a defesa e a preservação do meio ambiente, e para a valorização das comunidades e povos tradicionais da Amazônia?”

São igualmente questionados a pouca importância dada a temas de grande impacto na região como construção de hidrelétricas e estradas que favorecem as grandes empresas e os mercados consumidores do sul e sudeste, assim como a postura da Igreja em aceitar o patrocínio e de não usar seu poder de influência e capilaridade na região para levantar, discutir e, se possível, resolver os problemas de ocupação de terras, desmatamento, violência e exploração na região.

Estas notícias e tantas outras encontradas na imprensa e em ações judiciais mostram que ainda há muito o que se fazer para conseguir implantar de forma coerente o que se declara à imprensa de grande circulação, em páginas da internet e aos investidores com o que é realmente operacionalizado em meios às dificuldades da vida real.

6. Considerações finais e limitações

Após uma apresentação detalhada das ações de sustentabilidade da empresa, em especial na região amazônica, podemos obter algumas considerações. A empresa possui um compromisso estratégico com a questão socioambiental, que pode ser observada desde a declaração de sua missão, visão e valores assim até a estrutura organizacional da empresa que possui uma diretoria específica para estas questões e a implementação dos projetos, sistemas, programas e códigos de conduta socioambientais.

As operações da Vale na região amazônica possuem uma influência muito grande na área, o que torna as operações mais vulneráveis a conflitos e problemas, por isso, a empresa mantém um relacionamento permanente com todas as comunidades do entorno das unidades operacionais e um acompanhamento rigoroso dos aspectos socioambientais deste entorno de acordo com os mais exigentes padrões internacionais, a fim de evitar conflitos e ao mesmo tempo atender às necessidades das comunidades locais, da comunidade internacional (seja mídia, governos ou clientes) e assegurar a segurança ambiental e a sustentabilidade das operações.

Uma informação obtida durante a entrevista com o empregado da empresa é que nas regiões mais carentes (as áreas de operação da Vale no Pará, por exemplo) a população tende a confundir muito o que é dever do Estado e o que é dever da iniciativa privada; então, há conflitos entre as comunidades e a empresa, pois o Estado nessas regiões é muito ausente e a situação precária. Assim, demandas por educação e saúde públicas acabam sendo feitas às empresas que atuam no local.

Outro problema muito grande nessas regiões, que também inclui a ausência do Estado, é a falta de planejamento urbano, ou seja, quando há a implantação de uma operação em certa região ocorre um fluxo migratório muito grande para o local e como não há abertura de vagas suficiente para absorver todos os candidatos e a economia local é, inicialmente, atrofiada para tal absorção o número de desempregados torna-se crescente. Sem políticas públicas de qualificação e alocação destas pessoas o número de crimes e o índice de violência na região aumentam. Tal fenômeno é exclusivamente associado à chegada da empresa ao local que acaba sendo considerada inimiga da comunidade e destruidora da “paz” no local.

A preocupação com as mudanças climáticas não ficam somente no acompanhamento dos futuros impactos, mas também é tratada de forma próativa através dos grandes programas de reflorestamento, preservação e compensação ambientais, dos programas de redução de consumo de materiais e energia e do estímulo ao reuso e à reciclagem reduzindo a produção de lixo. Além do acompanhamento da cadeia produtiva e do desenvolvimento dos parceiros em conformidade com os princípios do desenvolvimento sustentável.

Uma característica que deve ser destacada é que, apesar de operar em diversos países, a Vale não usufrui desta dispersão geográfica e, consequentemente, da variedade cultural das populações (inclusive quanto à questão ambiental) para seguir padrões variados de desempenho ambiental de acordo com a exigência do local, ao contrário, a empresa possui um sistema único de acompanhamento deste desempenho ambiental segundo os mais exigentes critérios internacionais.

A Vale, como todas as grandes empresas, está muito mais exposta à opinião pública do que muitas empresas menores. Isto muitas vezes faz com que problemas pontuais tomem dimensões muito maiores que a realidade, assim como as causas do problema e mesmo sua resolução – rápida ou não, simples ou não – sejam encobertas pelo “apelo político” do conflito para alguns grupos interessados que muitas vezes se autoproclamam vítimas mas nem foram afetados pelo problema. Tal oportunismo, entretanto, não pode esconder que ainda existem problemas verdadeiros para serem resolvidos na operacionalização das estratégias socioambientais definidas pela empresa globalmente, como também não pode ocultar o fato que a Vale investe vultosas quantidades tanto de recursos financeiros quanto humanos para tornar suas operações verdadeiras impulsionadoras do desenvolvimento nos locais em que estão.

Quanto à limitação, gostaríamos de ressaltar a dificuldade de se obter informações “novas” da empresa, pois tudo que nos foi oficialmente fornecido já é de conhecimento público, pois a empresa possui uma política de confidencialidade muito rígida o que não nos permite transcrever todas as informações obtidas na entrevista, por solicitação do próprio entrevistado.

Referências Bibliográficas:

A mineração e o desenvolvimento local na região de Juruti

Resumo

Com o desenvolvimento do tema “sustentabilidade” e uma cobrança cada vez maior por parte da sociedade e dos mercados consumidores, para que as empresas passem a atuar com responsabilidade socioambiental em seus empreendimentos, o caso da mina de Juruti, da ALCOA, no Pará, se apresenta como um modelo de empreendimento que visa o desenvolvimento local. Um projeto que já nasceu com uma temática socioambiental e deve servir de exemplo para outras empresas que pensem em se instalar na região amazônica. Buscou, desde sua concepção, um diálogo franco com a comunidade envolvida para que os impactos negativos trazidos pelo empreendimento fossem minimizados e os positivos potencializados. Apresentou-se baseado em um tripé que envolveu um fórum de desenvolvimento local, a geração de indicadores de sustentabilidade, e a criação de um fundo de desenvolvimento sustentável que viabilizasse os projetos idealizados em conjunto com a comunidade, buscando sempre andar em paralelo com as tendências globais de desenvolvimento sustentável e políticas socioambientais.

Abstract

With the development of the topic “sustainability” and a growing society and consumer markets demands by companies with social responsibility in their ventures, the case of Juruti mine, of ALCOA, on Pará, is presented as a model of venture aimed at the development site. A project that was born with a social issue and should serve as example for other companies that would like make ventures in the Amazon region. Sought, since its design, an open dialogue with community involved, to discuss the negatives impacts brought by venture, minimized its and enhance the positives. Was presented based on a tripod which involved a forum for local development, the generation of sustainability indicators, and create a fund for sustainable development that allows the projects designed in conjunction with the community, always seeking to go in parallel with global trends of sustainable development and social policies.

1. Introdução

O crescimento mundial tem, cada vez mais, aumentado as demandas pelos mais variáveis tipos de produtos, inclusive as commodities, como, por exemplo, o alumínio Em função disto, existe uma pressão ambiental e social cada vez maior sobre as áreas de onde são retirados tais produtos, como a mina de bauxita de Juruti, que será o assunto deste trabalho. Da mesma maneira, diante da crise ambiental que a humanidade se encontra, tem aumentado muito a preocupação e atenção sobre temas socioambientais por parte de consumidores, mercados, governos e sociedade. Quando se trata de um empreendimento na região Amazônica, que é o caso a ser estudado, esta atenção é ainda maior, visto que a área é foco de discussões internacionais, principalmente no que tange às questões voltadas ao aquecimento global, gerenciamento dos recursos hídricos e serviços ambientais. Sendo assim, empreendimentos que pretendem se instalar na região Amazônica enfrentam um grande paradoxo: “Como montar um negócio economicamente viável, que venha ao encontro das demandas do mercado mundial e ao mesmo tempo ao encontro dos anseios da sociedade local e consumidora. Como torná-lo um negócio duradouro e sustentável até as próximas décadas?” O presente trabalho busca apresentar a empresa Alcoa e mais especificamente seu projeto Juruti, inserido na região Amazônica, levando em consideração o atual contexto ambiental global, as questões de sustentabilidade que permeiam as atividades privadas e o contexto social local.

2. Objetivo

O presente estudo busca identificar, caracterizar e analisar as estratégias de sustentabilidade utilizadas pela Alcoa no projeto Juruti. Quais foram as principais oportunidades e desafios identificados pela empresa, como o contexto socioambiental da região influencia no desenvolvimento do projeto e quais as principais ações que devem ser executadas para o desenvolvimento de um empreendimento amazônico tipicamente sustentável. Tais dados devem gerar informações que sirvam como benchmarking para outras empresas que pretendam se instalar na região.

3. Metodologia

Para a elaboração do artigo foi realizada revisão bibliográfica sobre os assuntos que estão na pauta de discussões sobre mudanças climáticas, sustentabilidade, desenvolvimento amazônico e de comunidades. Tais informações serviram de subsídio para o complemento de uma entrevista realizada com Fábio Abdala, consultor de sustentabilidade da mina de Juruti, da ALCOA. A entrevista foi uma das fontes de apresentação do projeto e foi adaptada de um questionário desenvolvido pelo professor Jacques Marcovitch para o desenvolvimento deste trabalho.

4. Cenário Global

O atual cenário global tem mostrado que além da crise econômica que tem devastado grandes economias, o mundo vem enfrentando a crise mais ameaçadora que a humanidade já enfrentou: a crise do aquecimento global, fruto de uma exploração descontrolada dos recursos ambientais e que já começa a trazer sérias consequências não só para as economias como para a vida de milhões de seres humanos. Problemas como eventos naturais extremos, prejuízos a culturas alimentícias e refugiados ambientais são somente alguns dos exemplos que podem ser citados. Em dezembro deste ano ocorrerá a COP-15 Copenhague, o encontro mais importante da história recente dos acordos ambientais que irá definir o tratado que substituirá o Protocolo de Kyoto para combater as mudanças climáticas globais. O grande impasse que deverá ser discutido é a questão de metas de redução de gases de efeito estufa entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, bases para um esforço global de mitigação e adaptação. Tal cenário tem trazido nos últimos anos o tema “meio ambiente” à tônica, antes, encarado pela maioria das empresas simplesmente como uma questão de cumprimento de leis e normas ambientais, por meio de uma postura reativa. Consequentemente, o tema “sustentabilidade” entrou em pauta e acabou trazendo outras questões importantíssimas para o desenvolvimento da humanidade. Entre elas, a grande desigualdade social, a miséria em sociedades falidas e os conflitos sociais causados por uma complexa interação de políticas econômicas baseadas no atual modelo de rápido crescimento econômico e tecnológico trazido pelo último século.

Com o constante aparecimento de tais questões na mídia e cobranças cada vez maiores por parte de consumidores e sociedade, as organizações privadas passaram a perceber que ações de sustentabilidade seriam estratégicas para o seu desenvolvimento no longo prazo, pois além de ir ao encontro dos anseios da sociedade pode trazer benefícios econômicos no longo prazo, como a reutilização de resíduos, redução de recursos, geração de novas oportunidades de negócios, além de benefícios sociais, como o fortalecimento da sociedade onde o negócio está inserido. Para isso a postura empresarial tende a mudar para pró ativa, buscando enfrentar potenciais problemas antes que eles aconteçam.

5. Sustentabilidade

Segundo o Relatório de Brundtland (1987), sustentabilidade é: “suprir as necessidades da geração presente sem afetar a habilidade das gerações futuras de suprir as suas”. Entretanto, nos últimos anos tal termo se tornou “modismo” e às vezes é utilizado somente como marketing ambiental. Sustentabilidade é um conceito sistêmico, relacionado com a continuidade dos aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais da sociedade humana e são esses aspectos que deverão ser analisados no caso do Projeto Juruti.

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Figura 1: Adaptada de John Elkington

Conforme se pode observar na figura 1, a empresa que almeja ser sustentável deve, primeiramente, ter um grupo gestor comprometido com o tema, a fim de proporcionar uma cultura organizacional e uma visão sistêmica onde todo o conjunto se relaciona e se retroalimenta. Inclui, dentre seus objetivos estratégicos: viabilidade econômica, cuidado com o meio ambiente e com a sociedade, bem estar dos stakeholders e a constante melhoria de sua própria reputação.

Economicamente, as empresas devem trazer bom retorno ao investimento realizado pelo capital privado. Em termos sociais, deve evitar e mitigar impactos negativos gerados na sociedade, potencializar impactos positivos, proporcionar as melhores condições de trabalho aos seus empregados, participar das atividades socioculturais da comunidade do entorno e proporcionar oportunidades a diferentes indivíduos. Já do ponto de vista ambiental, a organização deve se pautar pela eco eficiência dos seus processos e produtos, além de oferecer condições para o desenvolvimento de uma cultura ambiental organizacional. Portanto, é fundamental que as organizações consigam equilibrar de forma dinâmica as três dimensões da sustentabilidade, pois no longo prazo, dificilmente existirão bons negócios em sociedades desestruturadas. Um avanço em prol da sustentabilidade envolve mudanças profundas e de amplo alcance na atitude empresarial, incluindo a criação de uma nova ética na maneira de fazer negócios, que deve ser vista como um fator estratégico capaz de manter e criar valor no longo prazo, contribuindo para o desenvolvimento sustentável em sua zona de influência, e para o desenvolvimento das novas gerações.

Práticas já estabelecidas de sustentabilidade corporativa permitem às empresas reduzir custos, aumentar a fidelidade dos funcionários e clientes, criar novos mercados e reduzir as chances de serem surpreendidos por algum tipo de ônus indesejável e inoportuno. (Cantarino, 2003).

Em entrevista recente, Michael Porter afirma que “as empresas têm uma estratégia econômica e uma estratégia de responsabilidade social, quando o que deveriam ter é uma estratégia só, a fim de gerar oportunidades, inovação e vantagem competitiva. Ainda estão perdendo dinheiro porque não aprenderam a enxergar a responsabilidade social corporativa como algo estratégico.”

Hoje, os stakeholders exigem ações de responsabilidade social corporativa mais efetivas e duradouras, que possam ser mensuradas através de indicadores econômicos e socioambientais. Iniciativas que somente buscam cumprir requisitos legais e gerar ações superficiais, assistencialistas, filantrópicas e paliativas já não bastam na sociedade atual e é neste contexto que este trabalho pretende identificar alguns pontos críticos presentes em negócios na região Amazônica, como é o caso da mina de Juruti, explorada pela Alcoa.

O Projeto Juruti Sustentável visa a atender aos três aspectos do tripé de sustentabilidade, vislumbrando o desenvolvimento regional: respeito ao Meio Ambiente, Responsabilidade Social e Sucesso Econômico. Identificada como uma das aspirações da própria comunidade de Juruti, a implementação deste modelo é uma iniciativa voluntária da Alcoa, que se soma a todas as ações em andamento, decorrentes de requisitos legais para a implantação da Mina de Juruti. (Alcoa, 2008)

6. Alcoa

A Alcoa é uma das líderes mundiais na produção e transformação de alumínio, um metal que exige uma grande quantidade de energia para ser produzido, mas é facilmente reciclável, além de ser leve, o que pode diminuir a demanda por energia quando transformado em rodas de carro ou revestimento de aeronaves, por exemplo.

Segundo o site da empresa, nos últimos anos, antes da virada do século, a Alcoa aumentou significativamente sua presença global por meio do crescimento interno, parcerias no mundo e grandes aquisições na Europa e nos Estados Unidos e em 2006 seu faturamento anual já tinha passado da casa dos 30 bilhões de dólares. O Projeto Juruti prevê a produção de seis milhões de toneladas de bauxita por ano na primeira etapa, podendo chegar a dez milhões de toneladas/ ano. Os investimentos, nos primeiros três anos, estão estimados em R$ 1bilhão. O empreendimento gera 1.500 empregos diretos na fase de operação. Durante a etapa de instalação, 4.300 empregos, entre diretos e indiretos.

7. Amazônia

A Amazônia do ponto de vista ambiental é o grande ativo do Brasil e também a responsável por um grande passivo. Cerca de 60% desta que é a maior floresta tropical do Mundo se encontra em território brasileiro. Isto traz ao país uma grande oportunidade de explorar de forma sustentável os recursos hídricos e da biodiversidade que este bioma proporciona. Entretanto, também traz grandes desafios: Como impedir o avanço da agropecuária sobre a floresta? Como impedir que o Brasil gere um imenso passivo ambiental com a geração de gases de efeito estufa devido a queima do bioma? Como proteger e manejar a maior bacia de água doce do Mundo?

Segundo o Plano Nacional de Mudanças Climáticas, a Amazônia é hoje a grande responsável pelas emissões brasileiras, respondendo por mais de 60% dos gases gerados pelo país. Por outro lado, é também um grande sumidouro de carbono, uma vez que apresenta 320 t de biomassa/ha. em uma área aproximada de 4.196.943 km².

Ainda há muito que fazer, mas algumas ações já vêm sendo tomadas, como o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAM), lançado pelo Governo Federal e que resultou na diminuição de 59% da taxa anual de desmatamento nesse bioma por três anos consecutivos – 2004 a 2007. O objetivo geral do Plano é a redução das taxas de desmatamento na Amazônia brasileira, por meio de um conjunto de ações integradas de ordenamento territorial e fundiário, monitoramento e controle, fomento a atividades produtivas sustentáveis, envolvendo parcerias entre órgãos federais, governos estaduais, prefeituras, entidades da sociedade civil e o setor privado. Segundo um recente estudo publicado pela consultoria McKinsey & Company, para implementar tais iniciativas, resultando na redução de 70% nas emissões de GEE em 2030, seria necessário um gasto anual de 5,7 bilhões de Euros associados à preservação da floresta Amazônica. O grande desafio é como levantar tamanha quantia e principalmente como investi-la. Recentemente foi criado o Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES e cujo objetivo é captar recursos para ações de combate ao desmatamento e de preservação da floresta. Entretanto ainda não seria o suficiente, uma vez que segundos estimativas do próprio BNDES o fundo tem um potencial para receber pouco mais de US$ 21 bilhões até 2021.

Não diferente de outras regiões amazônicas, a área onde se encontra o projeto Juruti enfrenta o desafio de eliminar a pobreza na região sem eliminar a floresta e os benefícios que ela proporciona, entretanto, além do município estar situado em uma área que sofre pressão predatória, “a ilegalidade (especialmente na extração de madeira) e a escala e tecnologia empregadas (especialmente na produção agropecuária de grande porte) tornam difícil a competição para iniciativas locais, sustentáveis e inovadoras.” (ALCOA, 2008)

Juruti insere-se em área de alta biodiversidade, cercada de unidades de Conservação, e caracteriza-se como “área disponível” para a expansão de atividades produtivas pelas políticas de planejamento territorial, podendo atrair atividades predatórias e que resultem em concentração de renda. A inserção de um empreendimento de mineração de grande porte na região pode ainda potencializar e amplificar tal fragilidade. (ALCOA, 2008)

O modelo de ocupação que predomina até os dias de hoje é chamado por Schneider (2000) de padrão “boom-colapso”. Trata-se de um modelo insustentável, uma vez que nos primeiros anos de exploração ocorre um “boom” na economia local que é movimentada por meio da exploração predatória da madeira, aumentando assim a circulação de capital na comunidade, assim como empregos e arrecadação. Entretanto, nos anos que se seguem observa-se o declínio econômico local, já que a madeira, principal propulsor da economia, se esgota. Segundo Gonzalez (2008), o Pará é um dos estados mais pobres do Norte do Brasil, apresentado em algumas de suas cidades IDH menores que 0,45, em contraste com os Estados do Sul que apresentam uma média de 0,78. A pobreza sempre foi uma grande aliada da devastação amazônica. Bürger (2008) afirma que a apropriação de terras na Amazônia se deu principalmente por parte de pequenos agentes através de ocupação espontânea e dos projetos governamentais de colonização. Tais agentes acabaram vendendo seus lotes para outros mais capitalizados, como madeireiras, mineradoras, entre outros.

Intervenções governamentais para o problema endêmico da pobreza das populações da região amazônica podem ser resumidas em simplistas ou megalomaníacas, mas sempre trouxeram como consequência o desmatamento. Com o fim de trazer progresso ao invés de investimentos no transporte fluvial, a construção de estradas e incentivos a projetos agropecuários, apesar de as terras não serem adequadas a este fim. (LEÃO, 2000 apud BURGERS et al., 2008).

Dificilmente ações governamentais isoladas conseguirão resolver tal questão sem um apoio dos entes privados, que ao se estabelecerem na região exercerão um papel importante no fomento e desenvolvimento da comunidade.

8. Conclusão

Diante do apresentado pelo entrevistado e pelas pesquisas realizadas, pode-se dizer que a ALCOA vem fazendo seu papel em rumo a sustentabilidade. O empreendimento ainda é recente, assim como a aproximação com os atores locais. Espera-se, portanto, que os indicadores desenvolvidos pela FGV sejam eficientes para mensurar os avanços regionais daqui a alguns anos. Somente aí será realmente possível dizer se todo o conteúdo apresentado foi realmente colocado em prática, trazendo um resultado positivo para as partes. Sem dúvida, um grande passo foi dado, uma vez que mostrou a disposição da empresa em fazer um empreendimento com uma relação de “ganha-ganha” com os atores locais, o que já indica uma mudança de atitude por parte do setor privado.

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